A coluna post do leitor desta segunda foi enviada por Angelica Toledo de Campinas.
"Ele aceitou suas limitações numa boa, embora conseguisse um tempo razoavelmente respeitável em um circuito que conhecesse"
Essa frase foi publicada pela revista Autosport em 1995 sobre o piloto japonês Taki Inoue. Embora seja reconhecidamente um dos pilotos mais limitados que já chegaram à Fórmula 1, ninguém pode negar que o japonês de Kobe não era um... otimista. Aos 22 anos começou sua carreira turismo no Japão, passando depois para os monopostos. Nem sequer nas categorias japonesas Inoue conseguiu algum destaque. Em 1987 ele freqüentou a escola de pilotagem Jim Russell, na Inglaterra, onde não só desconhecia a língua como também todos os circuitos daquele país. Além de algumas técnicas, lá ele aprendeu com seu patrão na Fórmula 1600: "Dinheiro é corrida. Sem dinheiro, sem corrida."
Sem dinheiro, de fato, ele voltou para o Japão, correndo na Fórmula 3000. Cinco anos, sem um pódio sequer. Em 1994 Inoue voltou para a Europa com os bolsos mais cheios, para disputar o Campeonato Europeu de Fórmula 3000 pela Super Nova. Enquanto seu companheiro de equipe Vicenzo Sospiri disputava o título até o fim, Inoue foi incapaz de marcar um único ponto. No GP da Sicília, Inoue foi tão lento na largada que ele conseguiu diminuir a velocidade a tempo e desviar dos 6 carros atravessados na pista após um acidente na primeira curva.
Se a saúde financeira é o que conta, a Fórmula 1 ao final de 1994 tinha equipes em estado terminal. Larrousse, Footwork, Simtek, Lotus e Pacific procuravam desesperadas por um "pay driver" que sanasse as suas contas. A Symtek ofereceu a Inoue e Sospiri um teste, e embora o italiano fosse muito mais rápido, Inoue tinha mais dinheiro, além do fato da corrida seguinte ser em Suzuka. O japonês então teve a sua primeira oportunidade. Após os treinos de sexta, Inoue ficou à frente apenas das terríveis Pacific (o que lhe garantia o 26o. e último lugar), embora tivesse ficado a mais de 3 segundos de seu companheiro de equipe, David Brabham.
Para sua sorte, assim que começou o treino de sábado, a chuva desabou em Suzuka.
Alguém pensaria: "puxa, então ele não era tão ruim assim". Mas nas palavras de Ukyo Katayama (logo quem!), ele era "uma porcaria".
A chuva continuou no domingo. Ainda durante a volta de apresentação o câmbio da Symtek ficou sem a quinta marcha. Na terceira volta, enquanto perseguia a Minardi de Michele Alboreto, Inoue aquaplanou na reta dos boxes, batendo no muro. Sem dinheiro (ou talvez, motivo) para correr a última prova na Austrália, Inoue voltou para a geladeira.
Em 1995 Inoue chegou a um acordo com a Footwork-Arrows no valor de US$4,5 milhões (aparentemente, levantados com movimentações financeiras ilegais). A tomar pelos acontecimentos bizarros que marcariam sua carreira naquele ano, talvez fosse melhor ter economizado o dinheiro.
No Brasil, a temporada começou com um enorme incêndio no motor. No segundo GP, na Argentina, Inoue se classificou com um tempo 10 segundos mais lento que o de Gianni Morbidelli com a outra Footwork, sendo que na corrida ele rodou. Em Imola bateu.
Em Mônaco ele estava conseguindo manter-se no ritmo de Morbidelli, mas no treino livre de sábado, ao perceber a aproximação da Sauber de Heinz-Harald Frentzen, ele abriu na Mirabeau e tirou o pé... só que com isso, o carro morreu ali mesmo. Ele conseguiu que um guincho rebocasse o seu carro para os boxes (o que demandaria uma volta inteira, já que naquele ponto ele havia passado da entrada dos boxes). Enquanto o caminhão puxava Inoue e sua Arrows inteirinha e bem acertada pelas ruas monegascas, o safety car iniciou umamo volta de inspeção da pista... e contra todas as possibilidades, o piloto francês Jean Ragnotti, que dirigia o carro, encheu a traseira da Arrows, destruindo o carro, virando-o de ponta-cabeça, e deixando Inoue com uma concussão.
No Canadá ele conseguiu um honroso nono lugar. Mas em Magny Cours ele e Katayama (logo quem de novo!) se encontraram ainda na primeira volta. Outra rodada em Silverstone, câmbio quebrado em Hockenheim. E então veio a Hungria...
A Arrows contratou para o lugar de Morbidelli outro pay driver, Max Papis. Inoue conseguiu se classificar em Hungaroring à frente do novato, sendo mais de 1 segundo mais rápido! Durante a prova, o motor estourou, e Inoue encostou o carro no canteiro com um princípio de incêndio. Sabendo que era ele quem iria pagar pelo estrago, o japonês saltou rapidamente do carro, e, ao se aproximar um bombeiro, ele mesmo tomou o extintor de sua mão e tentou apagar o fogo. Desesperado, Inoue correu para trás da Arrows... só para ser atropelado pelo carro de socorro que vinha buscá-lo. Ao vivo para o mundo, o japonês rolou por cima do capô, caiu em pé, e finalmente foi ao chão sentindo a perna esquerda. Um dos bombeiros, ao invés de acudi-lo, tomou o extintor das suas mãos. Provavelmente o embarasso doeu mais do que o atropelamento.
Recuperado para o GP seguinte, na Bélgica, terminou em 12o. Em Monza, Damon Hill o acusou de bloquear a sua passagem enquanto lutava pela liderança com Michael Schumacher, resultando em mais uma colisão entre ambos os postulantes ao título.
Alheio a isso, Inoue terminou em oitavo. Em Estoril, foi 15o., com destaque para o fato de ter estado, durante 12 minutos do treino de sexta, na pole provisória! Se Taki Inoue parecia progredir na pista, fora dela ele também fez das suas, anunciando que deixaria de tomar sua bebida favorida, vinho tinto francês, como boicote aos testes nucleares levados a cabo pela França no Atol de Mururoa. Naquela altura, depois de quatro corridas ao lado de Max Papis, o japonês se classificou melhor no grid três vezes.
No entanto o final da temporada não foi bom. Quebras em Nurburgring e Aida, último lugar em Suzuka, e mais uma rodada em Adelaide - ele estava olhando no retrovisor a aproximação de Schumacher, e esqueceu da curva.
Bem ou mal, Inoue estava no circo, e ele acertou com a Minardi para 1996, pagando US$3 milhões pela temporada. Mas na última hora um de seus patrocinadores cancelou seu contrato, e ele ficou a pé - para o seu lugar, a Minardi contratou Giangcarlo Fisichella.
Inoue ainda voltou a correr onde começou, em provas de marcas. Ele bateu durante os treinos para os 1000km de Suzuka em 1996 com um Porsche (na prova, sua equipe abandonou ainda na 18a. volta), e terminou em nada menos do que em 32o. lugar no Campeonato Japonês de Grand Turismo, em 1999. Hoje em dia, é manager de pilotos locais.
O Folclore permaneceu. Além do comentário de Katayama, Johnny Herbert, ao ser superado em mais de 2 segundos por Schumacher num treino com a Benetton, disse: "Eu me senti como Taki Inoue". Já seu patrão na Footwork, Jackie Oliver, tentou ser mais otimista: "Sua curva de aprendizado era bem acentuada, mas sua performance não saía do lugar".
E nas palavras amarguradas do próprio Inoue, esculhambado pela imprensa, por seus colegas, por seu patrão, e até por Katayama, consciente da sua passagem pela categoria máxima do automobilismo: "Fórmula 1 era um sonho, ok? Agora se foi. Eu acordei. Um pesadelo, eu esqueci completamente da Fórmula 1."
E, numa frase de auto-conhecimento, Inoue declarou sobre si mesmo na revista F1 Racing: "Bebe demais, fuma demais, preguiçoso filho da p..."
"Ele aceitou suas limitações numa boa, embora conseguisse um tempo razoavelmente respeitável em um circuito que conhecesse"
Essa frase foi publicada pela revista Autosport em 1995 sobre o piloto japonês Taki Inoue. Embora seja reconhecidamente um dos pilotos mais limitados que já chegaram à Fórmula 1, ninguém pode negar que o japonês de Kobe não era um... otimista. Aos 22 anos começou sua carreira turismo no Japão, passando depois para os monopostos. Nem sequer nas categorias japonesas Inoue conseguiu algum destaque. Em 1987 ele freqüentou a escola de pilotagem Jim Russell, na Inglaterra, onde não só desconhecia a língua como também todos os circuitos daquele país. Além de algumas técnicas, lá ele aprendeu com seu patrão na Fórmula 1600: "Dinheiro é corrida. Sem dinheiro, sem corrida."
Sem dinheiro, de fato, ele voltou para o Japão, correndo na Fórmula 3000. Cinco anos, sem um pódio sequer. Em 1994 Inoue voltou para a Europa com os bolsos mais cheios, para disputar o Campeonato Europeu de Fórmula 3000 pela Super Nova. Enquanto seu companheiro de equipe Vicenzo Sospiri disputava o título até o fim, Inoue foi incapaz de marcar um único ponto. No GP da Sicília, Inoue foi tão lento na largada que ele conseguiu diminuir a velocidade a tempo e desviar dos 6 carros atravessados na pista após um acidente na primeira curva.
Se a saúde financeira é o que conta, a Fórmula 1 ao final de 1994 tinha equipes em estado terminal. Larrousse, Footwork, Simtek, Lotus e Pacific procuravam desesperadas por um "pay driver" que sanasse as suas contas. A Symtek ofereceu a Inoue e Sospiri um teste, e embora o italiano fosse muito mais rápido, Inoue tinha mais dinheiro, além do fato da corrida seguinte ser em Suzuka. O japonês então teve a sua primeira oportunidade. Após os treinos de sexta, Inoue ficou à frente apenas das terríveis Pacific (o que lhe garantia o 26o. e último lugar), embora tivesse ficado a mais de 3 segundos de seu companheiro de equipe, David Brabham.
Para sua sorte, assim que começou o treino de sábado, a chuva desabou em Suzuka.
Alguém pensaria: "puxa, então ele não era tão ruim assim". Mas nas palavras de Ukyo Katayama (logo quem!), ele era "uma porcaria".
A chuva continuou no domingo. Ainda durante a volta de apresentação o câmbio da Symtek ficou sem a quinta marcha. Na terceira volta, enquanto perseguia a Minardi de Michele Alboreto, Inoue aquaplanou na reta dos boxes, batendo no muro. Sem dinheiro (ou talvez, motivo) para correr a última prova na Austrália, Inoue voltou para a geladeira.
Em 1995 Inoue chegou a um acordo com a Footwork-Arrows no valor de US$4,5 milhões (aparentemente, levantados com movimentações financeiras ilegais). A tomar pelos acontecimentos bizarros que marcariam sua carreira naquele ano, talvez fosse melhor ter economizado o dinheiro.
No Brasil, a temporada começou com um enorme incêndio no motor. No segundo GP, na Argentina, Inoue se classificou com um tempo 10 segundos mais lento que o de Gianni Morbidelli com a outra Footwork, sendo que na corrida ele rodou. Em Imola bateu.
Em Mônaco ele estava conseguindo manter-se no ritmo de Morbidelli, mas no treino livre de sábado, ao perceber a aproximação da Sauber de Heinz-Harald Frentzen, ele abriu na Mirabeau e tirou o pé... só que com isso, o carro morreu ali mesmo. Ele conseguiu que um guincho rebocasse o seu carro para os boxes (o que demandaria uma volta inteira, já que naquele ponto ele havia passado da entrada dos boxes). Enquanto o caminhão puxava Inoue e sua Arrows inteirinha e bem acertada pelas ruas monegascas, o safety car iniciou umamo volta de inspeção da pista... e contra todas as possibilidades, o piloto francês Jean Ragnotti, que dirigia o carro, encheu a traseira da Arrows, destruindo o carro, virando-o de ponta-cabeça, e deixando Inoue com uma concussão.
No Canadá ele conseguiu um honroso nono lugar. Mas em Magny Cours ele e Katayama (logo quem de novo!) se encontraram ainda na primeira volta. Outra rodada em Silverstone, câmbio quebrado em Hockenheim. E então veio a Hungria...
A Arrows contratou para o lugar de Morbidelli outro pay driver, Max Papis. Inoue conseguiu se classificar em Hungaroring à frente do novato, sendo mais de 1 segundo mais rápido! Durante a prova, o motor estourou, e Inoue encostou o carro no canteiro com um princípio de incêndio. Sabendo que era ele quem iria pagar pelo estrago, o japonês saltou rapidamente do carro, e, ao se aproximar um bombeiro, ele mesmo tomou o extintor de sua mão e tentou apagar o fogo. Desesperado, Inoue correu para trás da Arrows... só para ser atropelado pelo carro de socorro que vinha buscá-lo. Ao vivo para o mundo, o japonês rolou por cima do capô, caiu em pé, e finalmente foi ao chão sentindo a perna esquerda. Um dos bombeiros, ao invés de acudi-lo, tomou o extintor das suas mãos. Provavelmente o embarasso doeu mais do que o atropelamento.
Recuperado para o GP seguinte, na Bélgica, terminou em 12o. Em Monza, Damon Hill o acusou de bloquear a sua passagem enquanto lutava pela liderança com Michael Schumacher, resultando em mais uma colisão entre ambos os postulantes ao título.
Alheio a isso, Inoue terminou em oitavo. Em Estoril, foi 15o., com destaque para o fato de ter estado, durante 12 minutos do treino de sexta, na pole provisória! Se Taki Inoue parecia progredir na pista, fora dela ele também fez das suas, anunciando que deixaria de tomar sua bebida favorida, vinho tinto francês, como boicote aos testes nucleares levados a cabo pela França no Atol de Mururoa. Naquela altura, depois de quatro corridas ao lado de Max Papis, o japonês se classificou melhor no grid três vezes.
No entanto o final da temporada não foi bom. Quebras em Nurburgring e Aida, último lugar em Suzuka, e mais uma rodada em Adelaide - ele estava olhando no retrovisor a aproximação de Schumacher, e esqueceu da curva.
Bem ou mal, Inoue estava no circo, e ele acertou com a Minardi para 1996, pagando US$3 milhões pela temporada. Mas na última hora um de seus patrocinadores cancelou seu contrato, e ele ficou a pé - para o seu lugar, a Minardi contratou Giangcarlo Fisichella.
Inoue ainda voltou a correr onde começou, em provas de marcas. Ele bateu durante os treinos para os 1000km de Suzuka em 1996 com um Porsche (na prova, sua equipe abandonou ainda na 18a. volta), e terminou em nada menos do que em 32o. lugar no Campeonato Japonês de Grand Turismo, em 1999. Hoje em dia, é manager de pilotos locais.
O Folclore permaneceu. Além do comentário de Katayama, Johnny Herbert, ao ser superado em mais de 2 segundos por Schumacher num treino com a Benetton, disse: "Eu me senti como Taki Inoue". Já seu patrão na Footwork, Jackie Oliver, tentou ser mais otimista: "Sua curva de aprendizado era bem acentuada, mas sua performance não saía do lugar".
E nas palavras amarguradas do próprio Inoue, esculhambado pela imprensa, por seus colegas, por seu patrão, e até por Katayama, consciente da sua passagem pela categoria máxima do automobilismo: "Fórmula 1 era um sonho, ok? Agora se foi. Eu acordei. Um pesadelo, eu esqueci completamente da Fórmula 1."
E, numa frase de auto-conhecimento, Inoue declarou sobre si mesmo na revista F1 Racing: "Bebe demais, fuma demais, preguiçoso filho da p..."
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