Nelson Piquet estava doente na semana em que conquistou o seu primeiro título mundial de Fórmula 1. Em Las Vegas, ele se queixava de enjoos, dores no corpo e vômitos ao levar o seu Brabham BT-49C para um circuito construído no pátio do estacionamento do Caesar Park Hotel. O que não foi empecilho para ele sair de lá, há exatos 30 anos, como o segundo piloto brasileiro a ganhar o título da principal categoria do automobilismo mundial.
Naquela temporada de 1981, Piquet ainda não havia conseguido atrair para si a mesma empatia do bicampeão Emerson Fittipaldi - vencedor dos campeonatos de 1972 e 1974. Não que ele se importasse com isso. Era o quarto ano do carioca criado em Brasília, filho do ex-ministro da Saúde Estácio Gonçalves Souto Maior (que reprovava a sua carreira), como piloto de Fórmula 1. Ainda novato, ele já demonstrava a prepotência que o caracterizou por toda a vida.
"Certamente que nunca Nelson Piquet será um ídolo como Emerson Fittipaldi foi. Ele não é simpático e nem um pouco político ou chega a ser até grosseiro com aqueles que o interpelam, dizendo que só vai falar sobre automobilismo e daquilo que se refere ao carro. Fora disso, não quer falar nada, principalmente de sua vida fora das pistas. Para seus amigos, com quem convive bem, é apenas o Nelsinho. Com os jornalistas, o relacionamento é puramente profissional", criticava o jornal A Gazeta Esportiva, mesmo após os resultados expressivos obtidos em 1981.
Piquet teve uma trajetória semelhante à de Emerson Fittipaldi em seu início de carreira. Estreou na Fórmula 1 no Grande Prêmio da Alemanha de 1978, com um carro alugado da equipe Ensign, pouco tempo depois de conquistar a Fórmula 3 inglesa. Não terminou aquela prova, mas agradou a ponto de correr outras três vezes com o McLaren da BS Fabrications. Na temporada seguinte, ao lado de Niki Lauda, marcou três pontos pela Brabham e ficou com a 15º posição ao final do campeonato. Em 1980, já como primeiro piloto, disputou o título até o fim com o australiano Alan Jones, graças a três vitórias, dois segundos lugares, três terceiros e três quartos.
A consagração de Nelson Piquet veio, de fato, em 1981. Ele começou bem a temporada, com uma terceira colocação no GP do Oeste dos Estados Unidos. No Gp do Brasil, contudo, insistiu em pilotar com pneus de pista seca no circuito de Jacarepaguá, bastante molhado por uma chuva intermitente. O resultado foi um frustrante 12º lugar, um dos seus piores no campeonato. Com duas vitórias consecutivas, na Argentina e em San Marino, o brasileiro se reergueu e entrou definitivamente na disputa pelo título. Chegou à última prova do ano, em Las Vegas, com o argentino Carlos Reutemann e o francês Jacques Laffite como seus rivais pelo troféu.
Tudo parecia conspirar a favor de Reutemann. A começar pelo mal-estar de Nelson Piquet, que ainda enfrentava dificuldades técnicas para ajustar a sua Brabham. "No primeiro dia de treinos, um massagista (até parecia argentino), ao massagear Piquet, acabou complicando mais o caso e seu pescoço ficou totalmente imobilizado, quase o impedindo de participar do primeiro treino oficial", relatou a Gazeta Esportiva da época.
Saudável, Reutemann fez a pole position no treino classificatório de Las Vegas e alimentou as esperanças do povo argentino. O presidente Roberto Viola chegou a enviar um telegrama para incentivar o piloto do seu país, com a mensagem: "Manifesto que todos os seus compatriotas estarão acompanhando-o na busca da vitória. Os argentinos sabem que você colocou todo o seu esforço e perícia para obter o principal título do automobilismo mundial, com ótimos resultados. O valor de seu empenho e de suas qualidades desportivas é o que mais apreciamos. Você já triunfou".
Reutemann, no entanto, não triunfou como campeão de Fórmula 1. Na véspera da corrida decisiva, Nelson Piquet recebeu outro massagista em seu hotel e submeteu-se a uma sessão de tratamento de 1h30.
"Fiquei bem relaxado, com menos dores", avisou. Largando em quinto (após mais de 20 minutos de atraso para o começo do Grande Prêmio), ele fez uma prova considerada técnica para cruzar a linha de chegada na mesma posição e ficar com o título por apenas um ponto de diferença em relação ao seu adversário argentino (50 a 49).
Já Reutemann pareceu ter herdado os problemas de Nelson Piquet, na corrida. A caixa de câmbio da Williams do argentino não estava confiável. "Carlos teve mais obstáculos do que eu. Vi que o seu veículo ficou em apuros", comentou o brasileiro, que também precisou superar algumas adversidades na pista. "Pela direção, senti uma enorme vibração na parte traseira do meu carro e pensei que poderia perder um pneu a 100 metros da chegada".
Naquele tempo, as fabricantes Goodyear e Michelin travavam uma guerra para vender seus pneus às escuderias de Fórmula 1.De Goodyear, ao contrário de Piquet, Carlos Reutemann acabou a prova no oitavo lugar, uma volta atrás do vencedor, campeão de 1980 e companheiro de equipe Alan Jones. Para a imprensa argentina, não restava dúvidas: as brigas do piloto sul-americano com o australiano e o claro desfavorecimento da Williams (a Argentina possui rivalidade histórica com a Inglaterra) haviam sido preponderantes para o vice-campeonato. No GP do Rio de Janeiro, por exemplo, Reutemann recebera ordens de Frank Williams para deixar Jones ultrapassá-lo e ignorou. Seu desafeto, então, recusou-se a subir no pódio para ser premiado como segundo colocado.
Jones deu o troco com a vitória no GP de Las Vegas, que assegurou o título de Nelson Piquet. "Foi ótimo chegar tão à frente de Reutemann. Estou satisfeito", ele sorriu. Até o brasileiro, campeão, admitiu: "Os desentendimentos entre Jones e Reutemann contribuíram para a minha vitória na temporada, sem dúvida". Para o lendário piloto argentino Juan Manuel Fangio, dono de cinco títulos de Fórmula 1 (1951, 1954, 1955, 1956 e 1957) e falecido em 1995, não havia explicação para a derrota para Nelson Piquet na tabela de classificação: "Não entendo nada. Apenas Reutemann pode explicar o que aconteceu. Eu estava convencido da vitória, já que tudo tinha sido preparado, e ele fez uma boa largada. Dar conselhos é muito difícil, quase nunca serve, menos ainda quando não foi algo solicitado. Reutemann já tem dez anos de Fórmula 1 e deve estar um pouco saturado". Realmente, Carlos Reutemann largou a categoria em 1982 e tornou-se governador da província de Santa Fé.
Em oposição a toda a lamentação argentina, o outro postulante ao título de 1981 se resignou. "Não creio que Piquet seja um grande campeão, como eu também não teria sido, mas o seu talento é tamanho que ele ganhará mais vezes esse título", profetizou Jacques Laffite, sobre o brasileiro que também levaria os troféus de 1983 e 1987.
A primeira vez, contudo, era inesquecível. Nelson Piquet tirou a feição carrancuda do rosto para vibrar como um jovem depois do feito alcançado. "Mal posso acreditar. Estou louco de alegria. Tive alguns problemas com pneus no meio da corrida. Além disso, quando me anunciaram que faltavam 33 voltas para o final, creio que se equivocaram. Não sabia verdadeiramente quem havia ficado para trás, salvo o Reutemann, que era quem importava", comemorou.
Foi também a vez de o governo brasileiro se manifestar, através de um telegrama do então presidente João Figueiredo para Nelson Piquet: "Como torcedor que tem acompanhado com interesse sua brilhante carreira, envio-lhe, em nome de meus familiares, da equipe que me acompanha e no meu próprio, os parabéns calorosos pela conquista do campeonato mundial de pilotos".
A alegria foi tanta que Nelson Piquet estava curado dos problemas de saúde. "Na chegada, ainda me rodaram muito, e olhem que eu já sentia dores no pescoço e nas costas durante toda a semana", sorriu o brasileiro, há exatas três décadas.
fonte: terra.com.br
Naquela temporada de 1981, Piquet ainda não havia conseguido atrair para si a mesma empatia do bicampeão Emerson Fittipaldi - vencedor dos campeonatos de 1972 e 1974. Não que ele se importasse com isso. Era o quarto ano do carioca criado em Brasília, filho do ex-ministro da Saúde Estácio Gonçalves Souto Maior (que reprovava a sua carreira), como piloto de Fórmula 1. Ainda novato, ele já demonstrava a prepotência que o caracterizou por toda a vida.
"Certamente que nunca Nelson Piquet será um ídolo como Emerson Fittipaldi foi. Ele não é simpático e nem um pouco político ou chega a ser até grosseiro com aqueles que o interpelam, dizendo que só vai falar sobre automobilismo e daquilo que se refere ao carro. Fora disso, não quer falar nada, principalmente de sua vida fora das pistas. Para seus amigos, com quem convive bem, é apenas o Nelsinho. Com os jornalistas, o relacionamento é puramente profissional", criticava o jornal A Gazeta Esportiva, mesmo após os resultados expressivos obtidos em 1981.
Piquet teve uma trajetória semelhante à de Emerson Fittipaldi em seu início de carreira. Estreou na Fórmula 1 no Grande Prêmio da Alemanha de 1978, com um carro alugado da equipe Ensign, pouco tempo depois de conquistar a Fórmula 3 inglesa. Não terminou aquela prova, mas agradou a ponto de correr outras três vezes com o McLaren da BS Fabrications. Na temporada seguinte, ao lado de Niki Lauda, marcou três pontos pela Brabham e ficou com a 15º posição ao final do campeonato. Em 1980, já como primeiro piloto, disputou o título até o fim com o australiano Alan Jones, graças a três vitórias, dois segundos lugares, três terceiros e três quartos.
A consagração de Nelson Piquet veio, de fato, em 1981. Ele começou bem a temporada, com uma terceira colocação no GP do Oeste dos Estados Unidos. No Gp do Brasil, contudo, insistiu em pilotar com pneus de pista seca no circuito de Jacarepaguá, bastante molhado por uma chuva intermitente. O resultado foi um frustrante 12º lugar, um dos seus piores no campeonato. Com duas vitórias consecutivas, na Argentina e em San Marino, o brasileiro se reergueu e entrou definitivamente na disputa pelo título. Chegou à última prova do ano, em Las Vegas, com o argentino Carlos Reutemann e o francês Jacques Laffite como seus rivais pelo troféu.
Tudo parecia conspirar a favor de Reutemann. A começar pelo mal-estar de Nelson Piquet, que ainda enfrentava dificuldades técnicas para ajustar a sua Brabham. "No primeiro dia de treinos, um massagista (até parecia argentino), ao massagear Piquet, acabou complicando mais o caso e seu pescoço ficou totalmente imobilizado, quase o impedindo de participar do primeiro treino oficial", relatou a Gazeta Esportiva da época.
Saudável, Reutemann fez a pole position no treino classificatório de Las Vegas e alimentou as esperanças do povo argentino. O presidente Roberto Viola chegou a enviar um telegrama para incentivar o piloto do seu país, com a mensagem: "Manifesto que todos os seus compatriotas estarão acompanhando-o na busca da vitória. Os argentinos sabem que você colocou todo o seu esforço e perícia para obter o principal título do automobilismo mundial, com ótimos resultados. O valor de seu empenho e de suas qualidades desportivas é o que mais apreciamos. Você já triunfou".
Reutemann, no entanto, não triunfou como campeão de Fórmula 1. Na véspera da corrida decisiva, Nelson Piquet recebeu outro massagista em seu hotel e submeteu-se a uma sessão de tratamento de 1h30.
"Fiquei bem relaxado, com menos dores", avisou. Largando em quinto (após mais de 20 minutos de atraso para o começo do Grande Prêmio), ele fez uma prova considerada técnica para cruzar a linha de chegada na mesma posição e ficar com o título por apenas um ponto de diferença em relação ao seu adversário argentino (50 a 49).
Já Reutemann pareceu ter herdado os problemas de Nelson Piquet, na corrida. A caixa de câmbio da Williams do argentino não estava confiável. "Carlos teve mais obstáculos do que eu. Vi que o seu veículo ficou em apuros", comentou o brasileiro, que também precisou superar algumas adversidades na pista. "Pela direção, senti uma enorme vibração na parte traseira do meu carro e pensei que poderia perder um pneu a 100 metros da chegada".
Naquele tempo, as fabricantes Goodyear e Michelin travavam uma guerra para vender seus pneus às escuderias de Fórmula 1.De Goodyear, ao contrário de Piquet, Carlos Reutemann acabou a prova no oitavo lugar, uma volta atrás do vencedor, campeão de 1980 e companheiro de equipe Alan Jones. Para a imprensa argentina, não restava dúvidas: as brigas do piloto sul-americano com o australiano e o claro desfavorecimento da Williams (a Argentina possui rivalidade histórica com a Inglaterra) haviam sido preponderantes para o vice-campeonato. No GP do Rio de Janeiro, por exemplo, Reutemann recebera ordens de Frank Williams para deixar Jones ultrapassá-lo e ignorou. Seu desafeto, então, recusou-se a subir no pódio para ser premiado como segundo colocado.
Jones deu o troco com a vitória no GP de Las Vegas, que assegurou o título de Nelson Piquet. "Foi ótimo chegar tão à frente de Reutemann. Estou satisfeito", ele sorriu. Até o brasileiro, campeão, admitiu: "Os desentendimentos entre Jones e Reutemann contribuíram para a minha vitória na temporada, sem dúvida". Para o lendário piloto argentino Juan Manuel Fangio, dono de cinco títulos de Fórmula 1 (1951, 1954, 1955, 1956 e 1957) e falecido em 1995, não havia explicação para a derrota para Nelson Piquet na tabela de classificação: "Não entendo nada. Apenas Reutemann pode explicar o que aconteceu. Eu estava convencido da vitória, já que tudo tinha sido preparado, e ele fez uma boa largada. Dar conselhos é muito difícil, quase nunca serve, menos ainda quando não foi algo solicitado. Reutemann já tem dez anos de Fórmula 1 e deve estar um pouco saturado". Realmente, Carlos Reutemann largou a categoria em 1982 e tornou-se governador da província de Santa Fé.
Em oposição a toda a lamentação argentina, o outro postulante ao título de 1981 se resignou. "Não creio que Piquet seja um grande campeão, como eu também não teria sido, mas o seu talento é tamanho que ele ganhará mais vezes esse título", profetizou Jacques Laffite, sobre o brasileiro que também levaria os troféus de 1983 e 1987.
A primeira vez, contudo, era inesquecível. Nelson Piquet tirou a feição carrancuda do rosto para vibrar como um jovem depois do feito alcançado. "Mal posso acreditar. Estou louco de alegria. Tive alguns problemas com pneus no meio da corrida. Além disso, quando me anunciaram que faltavam 33 voltas para o final, creio que se equivocaram. Não sabia verdadeiramente quem havia ficado para trás, salvo o Reutemann, que era quem importava", comemorou.
Foi também a vez de o governo brasileiro se manifestar, através de um telegrama do então presidente João Figueiredo para Nelson Piquet: "Como torcedor que tem acompanhado com interesse sua brilhante carreira, envio-lhe, em nome de meus familiares, da equipe que me acompanha e no meu próprio, os parabéns calorosos pela conquista do campeonato mundial de pilotos".
A alegria foi tanta que Nelson Piquet estava curado dos problemas de saúde. "Na chegada, ainda me rodaram muito, e olhem que eu já sentia dores no pescoço e nas costas durante toda a semana", sorriu o brasileiro, há exatas três décadas.
fonte: terra.com.br
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